Perdas
Perdas. Há uns tempos atrás descobri uma história na internet de uma pessoa que morreu muito nova com leucemia. Não a conheço, não conheço a família, mas como em qualquer história destas, consigo só imaginar a dor de perder alguém assim. Perder alguém já é/deve ser estupidamente doloroso. Perder alguém na flor da idade e ver essa pessoa a ser levada pela doença a cada dia deve ser ainda mais cruel.
E tudo isto me vem a propósito das perdas. Em grande ou pequena escala, pessoas, valores ou coisas, muito ou pouco de nós, todos perdemos sempre qualquer coisa em cada momento. Custe mais ou custe menos, com grande valor ou insignificantes, há sempre algo que se vai.
Perdemos sempre, e cada vez que tentamos não perder perdemos ainda mais, num ciclo sem retorno. Perdemos sempre, e no perder perdemos ainda mais. É inato à condição humana. Perdemos lugares, perdemos sentimentos, perdemos pessoas, perdemos sorrisos, perdemos muito e podemos perder quase tudo. O tudo ou o nada, perdemos sempre alguma coisa. Mais do que nunca sinto isso. E sinto ainda mais profundamente porque sou, e não consigo explicar como nem porquê, estapafurdiamente saudosista. Preciso dos lugares de sempre, preciso das pessoas de sempre, preciso dos amigos de sempre, preciso da base de sempre. Sou daquelas pessoas que agarra e amarra tudo e não consegue largar mais. Talvez isto esteja relacionado com a obsessão que ponho em tudo o que amo. Sou, sem dúvida, obsessiva, e sou daquelas pessoas que obstina, agarra e não larga até conseguir. Talvez por isso não consiga abandonar nada. Pelo menos nada do que é meu. Nada do que me esté na pele. Nada do que tem significado para mim. E por isso tudo o que está a suceder à minha volta me é infinitamente mais doloroso. Eu sou daquelas pessoas que consegue rejeitar tudo, mas mesmo tudo, até encontrar o que realmente quer. Eu sou assim em tudo, até com uma simples peça de roupa. Se é outra coisa que quero, nunca nada vai igualar isso e eu obstino com aquilo que quero. Posso encontrar até muito melhor, mas para mim tudo o que possa aparecer, bem pior ou indubitavelmente melhor, será sempre automaticamente rejeitado. Não sei explicar, mas sempre foi assim que fui.
E é isto tudo junto que me faz sofrer ainda mais. Infinitamente mais. Perdi tudo o que era meu, tudo o que sempre fui, tudo o que sempre tive. Desapareceu o meu mundo. E estou, estarei (sempre?) completamente à deriva. Perdi o mar, perdi-me e perdi o Norte. Perdi tudo, e foi tudo de uma vez só e tão de repente que ainda estou abananada. E não sei o que ou se posso recuperar. Talvez possa recuperar pedaços, talvez não, talvez um dia tudo, talvez não. Mas já perdi. E já tenho todas as feridas de todas as dores. Perder é perder. Perder é isso mesmo. É perder infinitamente na proporção do perder. É a dor daquilo que já não existe ou poderá não existir mais. É a mágoa toda a que fica. É a saudade que mata. É perder à velocidade de quem desfaz um castelo de cartas. É perder até ao fim da linha. Perder é mesmo isso (isto) tudo. É ficar sem um pedaço. Ou às vezes sem o corpo todo, melhor dizendo. E sentir sempre e intrinsecamente a falta dele.