Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

Manga Lima

Manga Lima

31
Dez18

Para 2019 - II

Manga Meia-Loira

365 novos dias a chegar. SÓ:  Quero sorrir. Quero entrar com balões pelo aeroporto para os receber no regresso final. Quero começar uma relação. Quero fazer amor. Quero contar estrelas a dois. Quero (re)construir memórias em família. Quero sonhar em família. Quero sonhar a dois.

365 dias. Só peço família e amor. O resto não interessa nada nem interessa para nada. 

 

31
Dez18

Para 2019

Manga Meia-Loira

Para 2019
Só podia escrever este texto aqui, no centro deste nosso projeto que os trará de volta. No centro deste projeto que nasceu este ano e está a crescer. No centro deste projeto que em 2019 estará pronto e crescido e a funcionar. No centro destas quatro paredes que me mostram todos os dias que vou voltar a ter um lar e uma família.
Para 2019 quero:
-Ir às chegadas do aeroporto buscá-los para o regresso final de coração cheio e balões na mão
-Trocar de casa
-Arrumar tudo o que tenho na outra casa e despedir-me daquele quarto que foi meu por acidente e por empréstimo e onde vivi tanto nestes últimos anos

-Reorganizar o meu quarto na nossa casa e dar-lhe nova vida
-Sorrir muito e sonhar ainda mais com o regresso deles
-Ter o coração em paz

-Ter o coração em paz e resolver esta ferida gigante de uma vez por todas: ou somos um do outro ou seguimos em paz

-Ter alguém especial na vida

-Entrar numa relação séria com direito a tudo e com tudo o que isso implica

-Dizer gosto muito de ti, dizer adoro-te, dizer "és a minha pessoa" e dizer amo-te (assim na loucura)

-Fazer amor

-Fazer amor na praia

-Abrir a porta desta casa em construção

-Cortar uma fita vermelha no dia em que abrir a porta desta casa

-Sorrir muito
-Viver uma paixão e um amor que me deixem nas nuvens

-Fazer férias em família

-Fazer férias a dois

-Fazer pelo menos um fim-de-semana a dois

-Levar o amor que quero ter pela mão a descobrir os sítios que são meus

-Fazer a estrada do Bom Jesus a dois

-Deitar-me no jardim a contar estrelas a dois

-Escrever uma tese

-Levar a minha irmã ao cinema, a passear, a lanchar e tudo o mais que eu quiser
-Dormir com a minha irmã sempre que me apetecer
-Descobrir o que significa acordar a dois

-Ter tempo para os amigos

-Conseguir que ele deixe de me magoar: ou é meu ou eu fico em paz com isso e encontro outro amor
-Almoçar em família

-Jantar em família

-Sorrir e sonhar em família

-Viver o Natal em família

-Viver o Natal a dois

-Deixar que me gostem, que me amem, que me beijem, que me apaixonem.
-Deixar que me amem sem medos nem reservas
-Deixar que o amor me leve pela mão e me faça descobrir tudo o que ainda não vivi
-Tomar o pequeno almoço em família
-Ir à praia em família
-Passear em família
-Passear com os amigos
-Ir à praia com os amigos
-Ir à praia a dois
-Na loucura entrar com um namorado em casa pela mão
-Vender o café e sentir um alívio enorme no dia em que isso acontecer
-Fechar a porta do café pela última vez e sorrir muito por isso
-Gostar do estágio e aprender muito
-Gostar das aulas da Ordem e aprender muito
-Começar os relatórios
-Deixar de precisar de psicoterapia (só porque isso significa que estarei tranquila com a vida, comigo e com o amor)
-Entregar uma tese e sorrir muito

-Fotografar o pôr-do-sol no Bom Despacho, no Bom Jesus e na Praia da Amorosa
-Fotografar o nascer do sol pelo menos uma vez
-Ver o pôr do sol em Esposende
-Sorrir muito
-Estar, rir, jantar, almoçar e conversar com as minhas amigas
-Estar acordada enquanto vejo o meu amor dormir e sorrir com isso
Provavelmente poucas coisas coisas farei mas algumas hão de acontecer. Provavelmente tudo o que escrevi em relação ao amor e a ter uma relação e a planos a dois não acontecerá. Mas tenho de sonhar. Pelo menos por hoje tenho de sonhar e acreditar. Quero mais do que tudo ter, pelo menos, o coração em paz. Quero também muito ter alguém a sério com quem possa fazer planos de vida. Não sei o que 2019 irá trazer. Queria, muito mais do que tudo o resto, daqui a um ano poder dizer que encontrei um amor, que sonhei, que sorri, que contei estrelas a dois, que fiz amor e que sonhei acordada. Queria muito. Será o que a vida deixar que seja. Só posso prometer fazer o melhor com aquilo que tenho. E farei.
Quanto à família, ao projeto que temos e a trocar de casa... acho mesmo que vai acontecer. Tenho medo da quantidade de sonhos que estou a pôr nisso, mas tenho-me permitido sonhar e acreditar a sério nisso. Tenho-me permitido ver a entrar por aquele aeroporto com uma mão cheia de balões e um coração a rebentar de felicidade. Que 2019 seja um 2009 em versão melhorada. Que as palavras de 2019 sejam, antes de qualquer coisa, duas: família e amor. Daqui a um ano fazemos contas... e eu só queria poder sorrir ao ler o que escrevi em relação ao amor.

31
Dez18

De 2018

Manga Meia-Loira

2018 chega ao fim. Falta um dia e este número vai-me ficar marcado para sempre com lágrimas. Não aconteceu nada e aconteceu tudo. Foi o ano em que o coração e a alma e a vida me doeram do primeiro ao último dia. O ano em que a ausência deles e o desamor me fizeram duvidar de mim, da vida e do sentido da vida. Recebi três prémios de excelência académica e não consegui ficar feliz. Estive no topo do sonho académico, fui distinguida mais que uma vez pela excelência que demonstrei, em cerimónias públicas e lindas, e não consegui viver isso. Foram dias únicos e especiais que acabei por não conseguir celebrar por causa dos meus pais e do desamor. Os meus pais não estiveram nas duas primeiras cerimónias mas estiveram na última. Fiz uma pós-graduação que há-de virar mestrado por entre lágrimas e uma deceção enorme com a universidade. Não tive uma única sexta de aulas em que não chorasse desalmadamente na viagem toda de volta a casa. Tive sábados que me doeram na vida e na alma. Tive domingos, tantos, em que continuei sem saber para onde vão os barcos que construímos quando estamos tristes e chorei. Andei muito de carro sem destino enquanto chorava para me tentar acalmar. Fiz muitas vezes a estrada entre o Sameiro e o Bom Jesus em lágrimas à procura de nem sei o quê.. talvez de um sentido para a vida e para o amor. Passei muitas, mas mesmo muitas vezes pelo Bom Despacho. Tive tardes de domingo em que peguei e fui dar a volta a Esposende de carro só porque sim ou porque estava profundamente triste e angustiada. Zanguei-me (tanto!) com os meus pais. Fui a Fátima. Os meus pais estiveram cá um mês no verão e fartei-me de chorar. Fui recebê-los ao aeroporto de alma desfeita, coração partido e frágil como nunca me senti. Chorei enquanto passava com eles de carro, num fim de tarde de verão, na praia da Apúlia, e me lembrava da vida feliz (tão feliz e completa) que já tivemos. Quis todos os dias vender o café. Quis, todos os dias, fechar a porta do café pela última vez. Quis todos os dias, mais do que qualquer outra coisa, que eles voltassem. Vi nascer o projeto que os vai trazer de volta. Isso foi o fio condutor da minha vida e da minha esperança. Quis muito que ele ficasse a trabalhar em Braga e ele ficou. Quis muito que ele acabasse a relação dele e corresse atrás de mim e não aconteceu. Fiquei sem chão e gélida de cada vez que ouvi falar do nome da relação dele. Fui abraçada por ele e ouvi coisas tão lindas dele que se calhar não devia e fiquei sempre surpreendida. Ouvi várias vezes que ele não sabe o que quer. Tive momentos de uma esperança enorme, seguidos de momentos de grande desesperança em que só queria que ele desaparecesse. Tive momentos de dor em que só queria que ele morresse para sempre. Um amigo meu suicidou-se e fomos enterrá-lo no meu dia de anos por isso não tive aniversário. No fim do funeral jantamos juntos na casa do meu desamor e até foi bom. Celebrei, por uma série de circunstâncias e acidentes, o meu aniversário na casa dele. Fiz consultas de psicoterapia seguidas do início ao fim do ano. Tive uma consulta em Maio e outra em Agosto em que só chorava de tão cansada e frágil que estava. Vivi dias em que achei que ia mesmo ficar com ele e dias em que só quis encontrar alguém que me apaixonasse para que ele fosse embora do meu coração e isso destruiu-me. Precisei todos os dias, mais do que nunca e mais do que qualquer outra coisa, da família e do lar que não tenho porque eles estão do outro lado do oceano. Fiz jantares em minha casa – nesta casa vazia de vida e de amor e de família – com as minhas amigas. Fui ao bananeiro pela primeira vez. Estive na Amorosa em família. Jantei em família na Bairrada numa noite bonita – talvez das mais bonitas do ano. Despedi-me deles e não estava mal nesse dia em que os deixei no aeroporto. Assinei um contrato de mediação imobiliária para vender esta casa vazia de amor e vida. Quis vendê-la mas já não sei se quero. Tive uma reunião em Janeiro no Nova Arcada que ninguém soube e foi aí que o projeto para eles voltarem começou. Tive uma reunião no Porto para vender esta casa e também ninguém soube. Fui várias vezes a uma consulta de telepatia e também ninguém soube. Ouvi várias vezes que gosto dele, que ele gosta de mim, mas que ele não sabe o que quer. Tive dias em que recusei ir a jantares ou fazer planos com eles por causa dele e porque não ia aguentar. Tentei forçar-me a participar e a estar sempre presente em tudo, ignorando a dor que ele me provoca. Tive muitas, mas mesmo muitas vezes, vontade de lhe dar um par de estalos e dois berros para ele acordar para a vida. Tive alturas em que quis mesmo perguntar-lhe o que se passa e o porquê das cenas que ele me faz. Voltei a ouvir falar da cena que aconteceu na Amorosa mais que uma vez. Comecei a estagiar. Inscrevi-me na Ordem. Fiz um projeto de tese. O estágio tem um dia ou outro feliz mas de resto é uma desgraça. Não tive forças nem coragem para arranjar um estágio noutro sítio ou para procurar e exigir mais. Larguei tudo sempre que foi preciso tratar de questões para vender os imóveis. Acreditei muito que vamos conseguir vender o café  e o apartamento. Ainda não aconteceu mas há-de ser em 2019. Quis todos os dias mudar de casa. Quis todos os dias voltar a ter um lar e uma família com os meus pais. Quis, todos os dias, encher esta casa de vida, família e amor. Quis fazer amor. Quis muito que ele fosse meu – muito mais que o que devia ou podia. Quis muito que, não sendo ele meu, me aparecesse um amor bom. Fiz uma consulta de astrologia e disseram-me que a partir de Maio de 2019 a vida vai melhorar. Fiz uma segunda em Agosto em que ouvi muita verdade e me disseram que estou em fase de terminar muita coisa e é possível que mude de casa. Fotografei algumas vezes a vista do Bom Jesus. Trouxe um Santo António para morar comigo no meu quarto. Marquei cafés com os meu amigos por minha iniciativa. Fiz duas simpatias em Dezembro e uma em Novembro. Entrei muitas vezes, mais do que nos outros anos todos juntos, nesta casa e algumas foram para tratar de papéis para vendas e para o projeto. Estive no Canadá em Outubro no aniversário da minha mãe. Marquei essa viagem no sábado a seguir ao meu aniversário, enquanto chorava no chão do quarto pelo desamor, pela ausência dos meus pais e pela semana de inferno que tinha tido. Conheci muitas pessoas no meio profissional e fui sempre bem acolhida e recebida. Estive na cerimónia de abertura do estágio da Ordem. Um amigo meu terminou uma relação de seis anos e uma vida em conjunto e ficamos estupefactos. As minha amigas querem muito que outra amiga nossa acabe a relação que tem porque dizem que é abusiva. Tive jantares de mestrado e foi bom. Senti todos os dias a falta de um colo onde pudesse rir e chorar. Senti todos os dias a falta de um amor que me deixasse o coração mais sereno e a vida mais leve. Achei muito que esse colo e esse amor fossem ele. Culpei-o muito – tanto! – por essa falta (e ele se não cumprir vai pagá-las e eu estou cá para ver). Culpei muito os meus pais por toda a frustração da minha vida amorosa. Arranjei um orientador de tese. Não comecei a tese mas quero. Estive na cidade no dia em que inauguraram as luzes de Natal e só desejei profundamente que daqui a um ano fosse tudo diferente. Fui fugindo do Natal enquanto pude até desabar completamente em lágrimas o fim-de-semana inteiro, há duas semanas. Tive, apesar de tudo, um Natal tranquilo dentro do que podia esperar. Vou, cinco anos depois, voltar a trabalhar na noite de passagem de ano... e há cinco anos também me sentia completamente perdida. Tentei ouvir música que me fizesse sentir melhor, tentei ler poesia e tentei o trinta um a sete para me acalmar. Tomei algumas vezes Alprazolam e Valdispert. Rezei. Sentei-me algumas vezes no Bom Jesus. Estive nos aniversários dos meus amigos. Desacreditei profundamente de mim, da vida e do amor durante muitos ou quase todos os dias deste ano. Desfiz a ideia errada que tinha de um amigo do meu pai porque tive de trabalhar com ele. Vi uma amiga minha chorar por um desamor como o meu e entendi demasiado bem tudo o que ela sentia. Saí à noite sempre que consegui. Saí de casa sempre que pude. Ouvi-o dizer que deixou de trabalhar com os pais e queria ir viver e trabalhar para outro sítio e fiquei gelada e sem chão. Não aconteceu e ele acabou no sítio onde eu queria muito que acabasse. Soube que ele tinha planos para vir viver para cá com a relação dele e fiquei estupefacta. Era a última das últimas coisas que queria que acontecesse e não aconteceu. Vi uma amiga minha com o pé todo torcido estatelada no chão e ficamos aflitas a chamar uma ambulância e com um almoço que ia ser bonito estragado. Ganhei as chaves do escritório. Descobri o Citius. Conheci clientes de que gostei e outros de quem tive uma pena profunda. Estive no Tribunal de Família em trabalho algumas vezes e saí de lá a perguntar-me a mim própria como é possível que a vida de alguém bata tanto no fundo. Achei, durante todos os dias do estágio, que não quero uma vida assim para mim. Fiz o último teste da universidade na pós-graduação. Estive várias vezes no meio do nosso projeto sozinha e escrevi coisas lá. Fingi, todos os dias o mais que pude, que no geral estou bem e está tudo bem. Não comprei roupa nem sapatos nem tive necessidade nem espírito nem vontade para compras. Fiquei presa na varanda do escritório. Vi uma procuradora sacar da esfregona em pleno tribunal e ri-me. Requisitei livros na biblioteca para a tese que não tenho usado, mas quero usar. Prometeram-me uma ida a uma conferência a Budapeste. O meu pai há-de vir cá daqui a três meses. A primeira fase do nosso projeto há-de estar pronta daqui a três meses. As minhas amigas continuaram solteiras. Não devia dizer isto mas ainda bem porque caso contrário é que batia no fundo. A minha prima também. Gostava muito que encontrássemos todas um amor doce em 2019. Fui parada pela polícia mas não fui multada. Fui ao cinema com a minha irmã sempre que pude. Houve um filme em que saí de lá a chorar por causa do (des)amor. Fiquei desiludida com os meus pais quando chegaram cá e quiseram ficar em casa a trabalhar. Fui ao batizado da Mafalda. O escritório desta casa vazia de tudo virou centro de transações imobiliárias. Deixei o notário constrangido porque o cumprimentei com dois beijos. Desejei profundamente sentar-me naquela mesa a assinar a escritura do café. Sentei-me sozinha na mesa de pedra numa tarde verão e desejei profundamente vender a casa e encontrar um amor no meio daquele momento. Sentei-me neste meu quarto em lágrimas a escrever isto há algum tempo. Quero que 2019 seja o ano de mudar a decoração deste quarto, instalar-me definitivamente aqui e encher estas paredes de vida e de amor. Há-de ser. Falta um dia para acabar. Não sei se está tudo mal...Durante muitos ou quase todos os dias deste ano fui uma alma perdida de coração desfeito. 2019 vem com promessas de mudanças. Muitas mudanças e mudanças muito boas. Assim seja.

14
Dez18

Sobre 2018

Manga Meia-Loira

2018 foi isto. Foi muito, demasiado, isto. Não só mas sobretudo isto. Paulada atrás de paulada no coração, bem no centro do coração, até sangrar. E depois suavizava e anestesiava. E a seguir vinha outra paulada em cima das feridas que já lá estavam. E anestesiava e vinha outra paulada, assim sucessivamente. Faltam duas semanas e não me lembro de querer tanto com todas as forças que um ano acabasse. Estamos de contas feitas, eu e 2018. 2018... Go fuck yoursef! A tua vez está passada!

A imagem pode conter: céu e ar livre

 

 

09
Dez18

Dos presentes de Natal

Manga Meia-Loira

Ainda (só) tenho 20 e alguns anos mas a verdade deste texto já me está colada ao coração e à alma há alguns. Desde os 18 que tudo o que mais peço não tem preço, não tem valor e não se compra. Neste momento, por exemplo, se fizesse uma lista de pedidos ao Pai Natal ia escrever uma série de coisas e nenhuma delas ia ser "comprável" em nenhuma loja. Ia pedir, com toda a força do mundo que só quem deseja profundamente algo desde as entranhas conhece, que os meus pais e a minha irmã voltassem a morar aqui. Que tanto tempo depois eu nunca mais tivesse ecrãs de ausência e saudades pelo meio. Ia pedir, com tanta ou ainda mais força, para ter o coração em paz e viver um grande amor que me deixasse tonta de felicidade e doçura. Isto? Isto era tudo e era mais (muito mais) que o suficiente. Só não sei em que loja se compra... ou na loja da vida ainda não descobri o corredor. 2019 é O ano para descobrir. É a primeira vez que escrevo isto e por isso repito.. já disse que 2019 é O ano? 2019 há-de ser também, entre muitas outras coisas boas e doces, o ano de Dez(l)embrar o natal-família, natal-aconchego e natal-amor. Sobre listas de presentes... a minha ficou feita. São (só) aqueles dois pedidos e não se fala mais nisso.

Resultado de imagem para quando amadurecemos natal não se pode comprar

07
Dez18

Simpatia

Manga Meia-Loira

Um dia sento-me contigo, bebo dois copos de Rosé, sirvo-te daquele açúcar rosa de hoje e dou-te a provar daquele doce mel de hoje. E dentro de mim haverá um anjo a sorrir por isso e a piscar-me o olho. Um dia faço-te isso e faço isso. E algo no universo sorrirá para mim. Um dia num futuro próximo. Ainda que tenha que ser numa outra vida. Ainda que tenhamos que renascer para que isso aconteça. Mas esse dia chegará e tudo baterá certo no mundo ainda que por apenas um segundo. 

07
Dez18

Simpatia

Manga Meia-Loira

Um dia sento-me contigo, bebo dois copos de Rosé, sirvo-te daquele açúcar rosa de hoje e dou-te a provar daquele doce mel de hoje. E dentro de mim haverá um anjo a sorrir por isso e a piscar-me o olho. Um dia faço-te isso e faço isso. E algo no universo sorrirá para mim. Um dia num futuro próximo. Ainda que tenha que ser numa outra vida. Ainda que tenhamos que renascer para que isso aconteça. Mas esse dia chegará e tudo baterá certo no mundo ainda que por apenas um segundo. 

07
Dez18

Sonho de Dezembro

Manga Meia-Loira

Ontem acordei e vi perfeitamente aquilo que sonhei. Estava com o meu pai e com o meu avô e foi tão lindo e tão aconchegante e tão sentido! Estava numa sala com um balcão, não sei bem o que era mas sei onde era. E o avô estava alto, muito alto, com os seus olhos azuis brilhantes e o sorriso tímido de sempre. Foi tão bom relembrar aquele azul-céu seis anos depois de ele próprio se ter transformado numa estrela do nosso céu. E eu estava lá encostada ao meu pai, como se estivesse no colo dele, e tenho tantas mas tantas saudades de o ver e ouvir ao vivo e a cores! Foi tão bom relembrar aquele aconchego único no mundo quando ele vive do outro lado do oceano e há anos que não o tenho como presença diária. 

 

Sim, tenho saudades do meu avô olhos-cor-de-céu, claro que tenho, e foi com um doce sorriso que recordei que ele esteve no meu sonho. Mas felizmento não posso dizer que a ausência ou a perda dele me doa: foi o ciclo da vida e ele teve uma vida longa, bonita, completa e feliz.. e há-de estar em paz a acenar-nos com um sorriso.

 

Mas com o meu pai é diferente. Ele vive demasiado longe, e seria sempre demasiado longe desde que não vivesse aqui, mas neste caso ele vive a mais de 5000km de mim, do outro lado do oceano... e isso dói-me. Dói-me ainda mais nesta época de Natal em que ele não pode vir cá e eu não quero ir lá por todas as razões. E foi reconfortante que por breves momentos, e mesmo que só num sonho, eu estivesse ali com ele e ao lado dele, ao vivo e a cores e a vê-o e ouvi-lo.

 

E isto já está muito lamechas mas é Dezembro, é Natal, e eu por breves momentos pude voltar a ser a neta que já fui há uma vida, e pude voltar a ser a filha-colo, filha-mimo e filha-abraço que também já não sou há tanto tempo e só Deus sabe o quanto eu preciso e sinto falta disso. E por isso foi doce, foi aconchegante, foi bonito, foi caloroso, foi reconfortante. Foi um sonho de natal bonito, assim uma éspecie de sonho-presente de natal antecipado. 

06
Dez18

Os caminhos do amor - uma história

Manga Meia-Loira

(Antes de ler: Esta história é um conto que decidi escrever e é pura ficção. Tem muito daquilo que estou a viver neste momento, claro que tem. Tem muito daquilo que sou: a Júlia podia ser eu e o Pedro podia ser alguém que muito bem conheço. O Guilherme não conheço, nasceu só de uma ideia. Dei à história um contorno muito diferente da realidade e acho que gostei do que fiz.) 

 

Júlia sempre foi conversadora, simpática e agradável, embora fosse também crítica, durona e extremamente exigente com ela e com todos.. talvez por isso sempre tivesse sido uma aluna de excelência. Cresceu numa família cheia de luz e de amor e sempre se habituou a conviver com muita gente porque os pais tinham um restaurante onde ela passou muito tempo. Na altura de escolher um curso superior, aliou o gosto que sempre teve pela biologia e pelo funcionamento do corpo às notas brilhantes e escolheu Medicina. Fez do curso quase uma missão, como fazia com tudo aquilo a que se dedicava, e foi até a melhor aluna do curso. Na Universidade mais perto de casa porque, se havia coisa da qual não abdicaria nunca, era de ter a família e as raízes sempre por perto. O seu percurso foi o normal, sempre foi uma menina responsável, equilibrada e amorosa com aqueles que faziam parte da sua vida. Foi fazendo amigos com facilidade por ser conversadora, embora fosse reservada, e nunca deu grandes problemas aos pais. Talvez por ser reservada e até tímida, e por se juntar a isso o tempo que sempre dedicou aos estudos e à leitura, a verdade é que Júlia não namorou nem teve,  durante a fase da adolescência e início da universidade, qualquer namorado ou "flirt" ou paixão.

 

Pedro sempre foi simpático, conversador e agradável, embora fosse também extremamente rebelde e tivesse uma personalidade que gostava de desafiar as regras e os conceitos. Astuto, opinativo e super brincalhão e até infantil, sempre gostou de viver ao sabor das suas vontades e sentimentos. Cresceu numa família estruturada e com muito amor, que sempre lhe foi tentado impôr regras, embora muitas vezes tivesse sido difícil. Era brincalhão e inconstante, e isso não costuma dar infâncias ou adolescências fáceis para os pais. Mesmo assim, a verdade é que sempre teve mais inteligência e sorte que juízo e lá foi seguindo a vida, tendo escolhido estudar Direito. Não queria fazer o curso perto de casa mas os pais impuseram-no e ele teve de aceitar. Naturalmente era daqueles estudantes de Direito que discordam da legislação, reivindicam uma série de mudanças em tudo e gostam de  pensar em esquemas para contornar a lei de forma duvidosa. Pedro sempre fez amigos com facilidade, sendo popular, e era a pessoa de quem se gosta logo à primeira impressão. Criava facilmente empatia com qualquer pessoa, adaptava-se muito bem às situações e tinha grande capacidade de levar as pessoas na sua conversa. Sempre foi também popular entre as raparigas e gostava disso e de se sentir apreciado. Achava que conquistava quem quisesse, o que não era totalmente verdade mas também não era mentira, e teve uma namorada na Escola Secundária. Depois teve várias paixões ou "flirts" que não passaram disso mesmo.

 

Júlia e Pedro frquentaram a mesma Escola Básica mas não se conheciam. Conheceram-se apenas no nono ano e de fugida, mal imaginando que integrariam a mesma turma na Escola Secundária. Durante o ensino secundário acabaram por fazer parte do mesmo grupinho e iam-se dando bem. Com o tempo, e já depois na universidade, o grupo manteve-se e a empatia entre os dois tornou-se ainda maior. Brincavam, riam, pegavam um com o outro - muito porque Pedro adorava contrariar as ideias de Júlia, sempre nobres e corretas - e eram bons amigos. Pedro adorava irritar Júlia e tocar nos pontos fracos dela, ou naquilo que ela achava importante, e Júlia adorava que ele o fizesse para lhe responder "à letra". Amigos, sim, só amigos. Júlia andava demasiado absorvida no curso e na sua vidinha e, por mais que gostasse de Pedro e não soubesse se até queria mais que uma simples amizade, nunca colocou isso sequer como hipótese. Eram demasiado diferentes, ela achava não se enquadrar no estilo dele e considerava que se ele gostasse dela não andava a "flirtar" com quem lhe apetecia e tentaria aproximar-se dela. Ele, por mais que gostasse dela e soubesse o impacto que ela tinha nele, nunca teve a capacidade de se tentar aproximar ou de tentar com ela aquilo que fazia com as outras miúdas. Talvez por serem amigos, por terem um grupo em comum e por ela fugir completamente do perfil a que ele estava habituado. Talvez por tudo isso... a verdade é que de forma indireta foi sempre dizendo que gostava dela, admirando-a, elogiando-a, fazendo questão de a abraçar, de a ouvir... de tudo isso. Gestos que podiam ser "brincadeira" como também podiam ser mais do que isso.

 

À medida que se aproximava do final do seu curso, Júlia deu por si a pensar mais em Pedro. Deu por si a sorrir mais cada vez que ele pegava com ela, a gostar ainda mais de estar com ele e das brincadeiras dele. Deu conta de tudo isso e percebeu claramente que não sabia lidar com isso. Era-lhe demasiado difícil e tinha definido na sua cabeça que seriam amigos e só amigos. Achava ser demasiado diferente de Pedro e achava ainda mais que não sabia lidar com aquele lado "mulherengo" dele. Para a deixar completamente bloqueada bastava juntar o facto de terem um grupo em comum e Júlia ter um medo gigante (maior que aquele que já teria numa situação normal) de que uma relação com ele pusesse alguma coisa em causa. Júlia não sofreu, achava simplesmente que seriam só amigos e que encontraria alguém como ela quando tivesse de encontrar. Alguém que lhe desse tranquilidade e não a fizesse sentir numa montanha russa. Pouco depois disso Pedro apresentou uma namorada, e Júlia ficou sem saber o que sentir. Durante o período em que se sentiu mais ligada a ele chegou a desejar que ele tivesse alguém para que ela ultrapassasse isso. E de um momento para o outro ele tinha alguém. Júlia não ficou propriamente abalada nem surpreendida, era a vida a seguir. E os meses foram passando. Passaram e a verdade é que Júlia, ao contrário do que esperava, sentia que Pedro brincava ainda mais com ela e tinha mais necessidade de a provocar. Um ano depois Júlia deu por si a refletir e, numa retrospetiva, percebeu claramente que Pedro estava a ter brincadeiras que deixavam no ar a ideia de que poderia gostar dela. Não lhe fazia sentido, ainda mais quando isso surgiu depois de ele ter assumido a relação com a Maria. Foi também nesse verão que Pedro teve uma atitude que desconcertou Júlia. Houve uma noite em que estavam a celebrar o aniversário de uma amiga, numa casa de praia, e Júlia para se divertir bebeu dois copos de vinho. Nunca acontecia, Júlia nunca bebia, mas naquela noite quis e lá bebeu. Pedro, apanhado de surpresa, e numa atitude que era a última coisa que Júlia poderia esperar, não a largou um minuto. Abraçou-a, não a largou um minuto quando saíram de casa para dar um passeio, e não descansou enquanto não se fartou de lhe dizer que ela era especial e de brincar afirmando que ela gostava dele e que iam dormir juntos. Júlia teve pela consciência de tudo e não disse quase nada, como era seu hábito. Ficou surpresa e limitou-se a encostar ao ombro dele. Seria o que tivesse de ser... mas naqueles momentos Júlia soube que havia ali sentimentos que nenhum deles era capaz de extravasar. Júlia ficou também extremamente assustada com o sentia e com o facto de Pedro ter uma relação e não foi capaz de conversar sobre isso, nem nos tempos seguintes. 

 

Os meses passaram e a verdade é que Pedro agia como se nada tivesse acontecido... e Júlia também não era capaz de expressar nada. Limitava-se a deixar o tempo passar mas perguntava-se até que ponto Pedro não teria sentimentos por ela... mesmo que racionalmente soubesse que se ele gostasse dela não teria namorada. Talvez Júlia esperasse que a relação dele acabasse, talvez não. Era uma confusão que a deixava nublada, sem chão e sem forças. Ainda mais porque Pedro continuou sempre com as mesmas brincadeiras e com brincadeiras que iam deixando dúvidas em Júlia. Passara-se dias, semanas, meses. Pedro continuava o seu caminho e a sua relação e mantinha o mesmo registo com Júlia... brincando e dizendo coisas que tanto podiam ser uma grande brincadeira (ou parvoíe) como uma insinuação de que tinha sentimentos por ela. Júlia desgastou-se, torceu-se, refletiu, repensou, escreveu, parou, pensou, duvidou, pôs em causa tudo. Não conseguia enfrentar a questão e confrontar Pedro... não sabia como o fazer. Conhecendo-o como conhecia também achava que ele ia brincar e fugir à questão. Não esperava dele um sim e também sabia que ele não lhe fecharia a porta dizendo um não. Foram dos meses mais desgastantes e angustiantes da vida de Júlia. Com a ajuda e o amor incondicional da família, com a presença e o carinho das amigas de curso e com a dedicação que devotava à profissão lá foi superando. Ainda chegou a fazer psicoterapia e percebeu a dificuldade que tinha em demonstrar sentimentos, a forma como nos podemos apaixonar por alguém que é tudo aquilo que não somos e muitas outras coisas. Um ano depois estava com o coração em paz. Pedro seria um amigo e ela estava de coração aberto para seguir e ser feliz. É aí que o Guilherme entra na nossa história. 

 

Guilherme era calmo, simpático, agradável, boa onda, muito tímido e boa pessoa. Cresceu numa família de professores e apesar de introvertido nunca teve grande dificuldade em fazer amigos. Era um miúdo simples e pacífico, sem grandes dramas e sem perfil para se envolver em problemas. Sempre foi um apaixonado por carros, desde criança, pelo que na hora de escolher um curso escolheu naturalmente Engenharia Mecânica. Não tendo grandes problemas em socializar, a verdade é que Guilherme tinha dificuldade em aproximar-se das raparigas. Era tímido e introvertido, o que não ajudava, e depois também escolheu um curso onde não haviam quase raparigas. Assim, era um miúdo com nenhum jeito para flirtar e pouco sucesso entre as miúdas.. até porque traçava, ainda que não percebesse, limites àquelas que se queriam aproximar. Guilherme era também amigo de infância de Pedro. Mais do que isso: o seus pais eram amigos e vizinhos, daqueles amigos que fazem férias juntos e tudo, e os dois andavam constantemente juntos desde que nasceram, no mesmo ano.

 

Júlia conhecia Guilherme mas apenas de vista e de o encontrar uma vez ou outra com Pedro, de raspão. Acontece que nesse verão Pedro organizou um jantar onde estava Guilherme e foi nesse mesmo jantar que Guilherme disse estar preocupado com o resultado de umas análises que tinha feito. Andava constantemente a sentir-se mal e não sabia porquê, pelo que fez umas análises que revelavam alguns valores alterados. Foi também nesse jantar que Júlia se disponibilizou a ouvir Guilherme e a ver as análises. Acabaram a noite a sorrir e a brincar, de uma forma que surpreendeu quem lá estava, e descobriram que o problema de Guilherme era uma deficiência de vitaminas do complexo B, resolvida com um suplemento. Depois desse jantar reencontraram-se numa festa organizada pelos pais de Pedro e a seguir Guilherme levou um amigo e o seu filho a uma consulta com Júlia, que era interna de pediatria. Foi depois disso que Guilherme convidou Júlia para a sua festa de anos, ao que se seguiu um convite para um jantar a dois. A partir daí, a história segue o guião do que se lê nos romances e no final desse ano já Júlia e Guilherme eram um par de namorados. Parecidos um com o outro - muito parecidos - e cúmplices, ambos se foram deslumbrando e descobrindo o bom que era ter alguém. Foi Guilherme quem contou a Pedro que tinham começado a namorar e Pedro sorriu e disse que sabia que ia acontecer. A partir daí tudo decorreu normalmente. Júlia e Guilherme chegavam até a comparecer juntos a eventos do grupo de Júlia e Pedro e Pedro mantinha a relação com Maria e o registo de brincadeira com Júlia. Chegaram até a jantar os quatro, Guilherme, Pedro, Júlia e Maria.

 

Passaram-se quase três anos. Júlia e Guilherme continuavam, diferentemente daquilo que ela como boa pessimista esperava, juntos e felizes. Guilherme havia-lhe dado uma paz e estabilidade que ela já tinha achado que nunca encontraria. Havia recuperado uma crença no amor e na vida que tinha ficado perdida à medida que foi crescendo. Pedro continuava a ser a mesma personalidade inconstante e provocadora. Nada de novo, portanto. Passaram-se quase três anos e Guilherme queria mais: queria planos de vida, queria planos para o futuro e queria incluir as palavras casamento e filhos nas conversas com Júlia. Pedro apoiou sempre a relação de ambos mas era um apoio que, embora não parecendo, era mais gozo e brincadeira que apoio. Isto é, Pedro achava piada ao facto de eles terem uma relação mas na verdade não encarava aquilo como algo sério... Era algo que quase lhe parecia surreal e estranho. O seu melhor amigo e a sua Julinha... dava-lha para rir. Para Júlia estavam a ser anos tranquilos e felizes. O internato esgotava-lhe muito do tempo que tinha e o resto era para a família, para Guilherme e para os amigos. A possível "história" com Pedro tinha ficado lá atrás, e embora nunca o tivesse confrontado ou conversado sobre isso, estava bem resolvida. Pedro seria sempre Pedro, e com o tempo e a entrada de Guilherme deixou de valorizar o que ele pudesse dizer. 

 

Nesse inverno, contudo, houve um episódio com Pedro que deixou Júlia estupefacta. Numa sexta à noite, em que Guilherme não estava porque tinha jogo de futebol, tinham combinado com o grupo de amigos ir beber um copo à cidade e tudo correu normalmente. Conversaram, riram e acabaram por falar daquilo que fariam se de repente surgisse uma gravidez não planeada. Sendo um assunto mais dirigido às meninas, os rapazes também participaram. Júlia disse logo que, antes de terminar a especialidade, era uma loucura pensar em ser mãe, mas que, se de repente estivesse grávida, o mais provável era não ser capaz de fazer uma interrupção... até porque Guilherme queria muito ser pai e ela acabou em pediatria por adorar crianças. Pedro ficou muito sério com o que Júlia disse e limitou-se a exclamar "O quê?? Tu não estás bem, vocês batem mal!" mais alto que o necessário. Os restantes disseram, no geral, que não estavam preparados para ter filhos, e Pedro limitou-se a dizer que queria ser pai mas num futuro longínquo. Mas foi nessa noite, enquanto se dirigiam aos seus carros para ir embora e caminhavam só os dois, que Júlia foi surpreendida. Pedro foi repescar o assunto e questionou-a quase exaustivamente sobre a relação com Guilherme, sobre o que sentia por ele, sobre a forma como ele era, sobre o que ela pensava da relação, sobre os planos que tinham. Não ficou por aí. Não fosse Júlia já estar surpreendida com o interrogatório repentino quando Pedro nunca lhe havia sequer feito grandes perguntas sobre Guilherme, Pedro continuou. Continuou e disse, de forma séria e alto "A sério que tinhas um filho com ele?! Com o Guilherme? A sério? Jura-me aqui e agora que não sou eu o pai dos teus filhos!" Júlia, embora admirada, continuou a andar para que ele fizesse o mesmo e limitou-se a dizer "Pedro, nós somos namorados há quase três anos e, além disso, tu também tens uma relação!" e não deu mais espaço para que a conversa continuasse. Foi o caminho de volta para casa com aquela frase de Pedro a ecoar e ficou completamente desconcertada. As pernas até lhe tremeram. Ainda assim, abraçou o pai e o irmão quando entrou em casa, bebeu um copo de chá calmante, atribuiu a cena de Pedro ao copo de vinho que o viu beber e aos problemas que o assolavam no trabalho e foi dormir. No dia seguinte nada de novo, e tudo seguiu em paz. Pedro continuou a agir naturalmente, embora se tivesse tornado um pouco mais brusco com Júlia. Mais ácido nas respostas, com mais tendência a desconstruir o que ela dizia, a partir para o ataque... mas apenas isso. 

 

Na última semana desse ano Júlia estava de férias e tinha ficado em casa de Guilherme. Antes da hora de almoço estava na cozinha, sozinha, a fazer omoletes e panquecas. Guilherme tinha ido à bomba de gasolina e prometera voltar rápido, pelo que quando ouviu alguém bater à porta e depois abri-la achou que seria ele. Júlia estava em pijama e ficou surpreendida quando viu que era Pedro que entrava à procura de Guilherme e rapidamente apertou o robe que tinha para se cobrir. Pedro ficou admirado por vê-la lá, ainda por cima sozinha na cozinha e em pijama, e começou a brincar com isso. Disse precisar de falar com Guilherme e depois, quando viu que Júlia estava a ter dificuldade em lidar com o fogão, ofereceu-se para a ajudar. Foi para a beira dela e, encostado a ela, segurou-lhe na mão para lhe explicar como voltava a ligar o fogão. Foi aí que, quase colados um ao outro e com ele a segurar-lhe no braço, Pedro a olhou nos olhos e disse "Júlia, acho que...". Júlia olhou-o entre o medo e a surpresa, com o coração acelerado, e ficou suspensa nos olhos azul-cor-de-mar dele, pelo que ele nem acabou a frase e beijou-a na boca. Segurou-a nos braços dele, como se tivesse medo que ela fugisse, e colou imediatamente a sua boca à dela beijando-a com paixão e sofreguidão. Não, não era um beijo calmo.. era um beijo intenso e carregado de paixão, com a pressa de quem tem medo que acabe rápido ou seja só um sonho. Júlia, que de imediato ficou envolvida naquele beijo e perdeu as forças, entregando-se por inteiro, estava a ficar sem ar e tentou parar dizendo "Pedro, não...". Mas ele não a deixou acabar a frase. Apertou-a mais contra si, agarrou-lhe o cabelo e continou a beijá-la. Beijou-a pelo pescoço enquanto lhe ia acariaciando o corpo todo e ela fazia o mesmo. Ao fim de uns minutos, Júlia reuniu força suficiente para se afastar dele e disse, num fio de voz e ainda a tremer, o mais rápido que conseguiu para não voltar atrás "Pedro, vai embora, Pedro, por favor sai daqui". Ele inspirou e com a mão na cabeça dirigiu-se para a porta, saindo. 

 

Quando a porta se fechou, Júlia deixou que a fraqueza das pernas a fizesse descer até ficar sentada no chão, lágrimas gordas a escorrerem continuamente por entre soluços. Pela primeira vez na vida estava sem caminhos, sem forças, sem reação e de coração desfeito. Pedro saiu pela porta e já não voltou a casa, onde estava Maria. Correu até ao carro e, enquanto as lágrimas lhe caíam pela cara e dava murros no volante, sentia um nó que lhe apertava o peito e o deixava sem ar. Conduziu até ao escritório e fechou-se no seu gabinete sem dizer nada a ninguém.

 

Para ele, ter visto Júlia na cozinha, descalça, meia despida e a sorrir genuinamente, de volta do fogão, foi o maior sopapo da sua vida. Sim, estava preparado para ouvir Júlia filosofar sobre grandes assuntos e temas, estava preparado para ouvir Júlia esgrimir argumentos de forma radical e absoluta até que eles se esgotassem, estava preparado para ouvir Júlia a fazer discursos com termos médico-clínicos. Estava preparado para ver Júlia ser altamente elogiada e receber prémios académicos, estava preparado para que ela se destacasse pela sua postura, discurso, qualidade académica e profissional. Mas não, Pedro não estava preparado para ver a Júlia-namorada ou a Júlia que é só uma mulher como as outras e vai para o fogão fazer coisas em pijama enquanto sorri. E isso deu-lhe a volta ao coração no momento em que abriu aquela porta. Isso fê-lo perceber que era aquilo tudo o que mais queria na vida, afinal: ter aquela Júlia, a que anda em pijama e descalça a sorrir, pela sua cozinha, pela sua casa e pela sua vida. E toda aquela cena de paixão foi a prova de que Pedro tinha andado a fugir: ele desconfiava que a Júlia-mulher fosse apaixonante, mas estava habituado á Júlia-amiga e à Júlia-médica.

 

Para Júlia, foi quase o mesmo. Achou normal que Pedro tivesse aparecido na casa do melhor amigo, mas no momento em que ele se encostou a ela e lhe pegou na mão para a ajudar com o fogão desisitiu de lutar contra o que estava a sentir. Naquele momento estava nos braços dele e não queria estar noutro qualquer lugar do mundo... queria ser dele e queria que ele fosse dela, e nada mais importava. A única coisa que quis, naqueles instantes, foi ficar ali para sempre e perder-se nos braços dele vida fora. Nunca tinha permitido, e ela tinha consciência disso, qualquer tipo de aproximação da parte dele. Ela era assim e criava naturalmente barreiras às pessoas. Mas tê-lo ali, e ver e sentir o acesso de paixão dele por ela, despertou-lhe sentimentos que nunca tinha imaginado sentir. Era ele quem ela queria ter a entrar pela sua cozinha e pela sua casa com beijos apaixonados, disso não duvidou.

 

O dia passou. Júlia recompôs-se a todo o custo, até porque Guilherme ia voltar, e disse-lhe estar com tonturas e má disposição para evitar ter de falar. Ficou o dia inteiro numa angústia e numa agonia inexplicáveis e à noite foi para sua casa. Pedro fechou-se no gabinete e enviou uma mensagem a Maria a dizer que surgiu um problema urgente. Só saiu de lá às 21h e foi de carro até à beira da praia. Às 23:30 Pedro enviou uma mensagem que dizia "Falamos sexta?". Júlia estava no quarto a chorar nos braços da irmã mais nova e viu logo a mensagem. Com o coração a subir e descer uma montanha russa disse "Sim. À noite?" E Pedro pediu que sim. Era quarta, e os dias de quinta e sextam duraram uma eternidade. Júlia evitou estar com Guilherme, mas ele insisitu em ir a casa dela na quinta e ela revolveu as entranhas para agir normalmente. Pedro tentou fugir de tudo e de todos e nem capacidade tinha para se concentrar no trabalho, tendo a vida facilitada porque Maria estava fora em trabalho. 

 

Sexta à noite. Júlia e Pedro tinham combinado ir ter ao pé da praia à noite. Nenhum dos dois tinha sequer conseguido comer nada durante o dia todo. Sentaram-se no paredão e nenhum deles sentiu o frio de fim de Dezembro. Pedro começou e disse que não sabia o que tinha acontecido mas que tinha mexido com ele de uma froma que ele nunca imaginou... que não estava preparado e foi apanhado de surpresa mas o que estava a sentir era muito intenso. Júlia disse que também não tinha explicações mas estava completamente perdida com o estava a sentir, que era muito intenso. Decidiram ir conversar para o carro de Pedro. Estiveram duas horas e meia a falar. Falaram do passado, falaram das relações que tinham, falaram de sentimentos. Choraram os dois, choraram quase do princípio ao fim, e falaram de sentimentos... que era aquilo que nunca tinham conseguido fazer. Concordaram que iam ambos terminar as relações que tinham, que não fazia sentido continuarem depois do que tinha acontecido e do que estavam a sentir. Júlia falaria com Guilherme nesse fim-de-semana e Pedro falaria com Maria quando ela regressasse. Continuaram a conversar e souberam os dois que queriam ver até onde aqueles sentimentos os levariam. Depois da conversa, das palavras e das lágrimas ficaram os dois aninhados um no outro e beijaram-se com paixão. Agora sem surpresas...agora com vontade, com sentido e com sentimento, deixando-se os dois levar pela paixão e pelo amor que estavam a sentir. 

 

A conversa com Guilherme foi dura, do mais difícil que Júlia alguma vez tinha feito na vida. Não lhe falou de Pedro ainda, falaria a seu tempo. A conversa com Maria também foi difícil, sendo que ela fez uma série de cenas dramáticas chegando a chorar e gritar com Pedro.

 

Júlia e Pedro estavam juntos sempre que podiam e iam sempre para fora da cidade, dado que ninguém sabia de nada. Apenas as irmãs de Júlia sabiam. Ao fim de uns meses foi Júlia quem falou com Guilherme e disse que estava a começar uma relação com Pedro. Guilherme teve uma explosão de sentimentos e disse tudo o que Júlia não queria ouvir mas já estava à espera de ouvir. Depois foi Pedro quem falou com Guilherme. Foi muito, muito difícil, e Guilherme fez o que Pedro não estava à espera: disse que não queria mais vê-lo ou falar com ele. Mas Júlia e Pedro tinham de o ter feito. Já não conseguiam mais ter de sair do seu meio para estarem juntos, já não queriam mais esconder. Estavam completamente apaixonados e perdidos um pelo outro e tudo o que mais queriam era poder viver isso em paz.

 

Não foi fácil, que não foi, assumirem a relação. Tinham de o fazer e foram fazendo naturalmente. Os amigos reagiram bem e com surpresa. Os pais de Júlia também. Os pais de Pedro nem tanto, estavam reticentes e não era fácil para eles por serem amigos de Guilherme e dos seus pais. A vida seguiu com naturalidade e Júlia e Pedro foram descobrindo o quanto gostavam, afinal, um do outro. Nunca tinham imaginado, ou não de forma real, o quanto encaixavam bem um no outro. Mas estavam felizes, felizes de uma forma completa e sentiam-se realizados de uma forma especial. Ele era a lufada de ar fresco que ela sempre tinha procurado sem ter consciência disso. Ela era a calma e a estabilidade que sempre lhe tinha feito falta sem ele saber.

 

Dois anos depois, Guilherme encontrou novamente o amor e estava com uma linda psicóloga. Júlia e Pedro continuavam juntos, felizes e com planos para o futuro. Guilherme continuava sem querer falar com Pedro embora ambos sentissem falta um do outro. Tinham partilhado juntos histórias de uma vida inteira, tinham crescido juntos e acompanhado sempre a vida um do outro. Era um vínculo de infância e de sempre. Viam-se quando tinham festas e na rua e continuavam sem falar. Ambos sentiram bastante a falta do outro quando, dois anos depois, cada um deles casou. Ambos viram que havia ali um lugar de infância por preencher. Um ano depois Guilherme foi pai e, com o brilho e a capacidade de renovação que só uma nova vida dá, decidiu responder à mensagem de Pedro e ligou-lhe a agradecer. Foram juntos, na semana seguinte, beber um copo. Conversaram, riram e celebraram. Ficaram em paz com o passado e com aquele pedaço de vida de que ambos sentiam falta. Regressaram à infância, reviveram aquilo que tinham juntos e apaziguaram as mágoas. O mesmo aconteceu quando, depois, Júlia e Pedro foram pais. Conversaram, riram, celebraram e reviveram a própria infância através das novas vidas que cada um deles tinha gerado. 

 

A vida é muito mais complexa, densa e tortuosa do que aquilo que podemos imaginar e os sentimentos são-no ainda mais. Aprenderam todos muito:

Júlia levou uma lição de vida e aprendeu que não controlamos o coração nem devemos fugir daquilo que sentimos. No mar daquilo que são as nossas emoções não há certo nem errado... e pode-se amar alguém de quem eramos amigos, e pode ainda mais amar-se alguém que "não ouve a mesma canção"... pode mesmo! Aprendeu a ter a coragem que nunca imaginou ter quando assumiu perante ela e o resto do mundo que era Pedro o amor da sua vida. Toda esta história foi, para ela, um curso intensivo de como ter coragem e assumir o que se sente. 

Pedro cresceu, cresceu muito. Percebeu que teve uma falta de coragem que lhe ia custando o amor da sua vida, que se deixou arrastar pela vida sem agir nem viver o que sentia, que foi incorreto (profundamente incorreto) para com ele próprio, e que só no limite teve um impulso que o fez dar um passo. Levou uma lição de coragem e de auto-conhecimento. Mudou muito e ganhou uma seriedade e responsabilidade que até o surpreendeu a ele próprio. Continuou a brincar, estava na sua essência, mas ganhou outros limites.

 

Tudo está bem quando acaba bem. Pedro percebia isso todos os dias quando a sua filhota, que tinha a cara dele e o feitio sério e argumentativo de Júlia, lhe corria para os braços com o maior sorriso do mundo. Percebia isso todos os dias no momento em que segurava Júlia nos braços quando entrava em casa e ainda mais quando, todas as noites, ela se aninhava no colo dele e encaixavam de forma perfeita um no outro... que era a maneira que o universo e Deus tinha de lhes dizer que nasceram para ser um do outro.

 

 

 

 

 

 

 

 

04
Dez18

Há um ano...

Manga Meia-Loira

Há um ano houve uma palavra que se desenhou na minha mente e por lá ficou. Margarida. Não sei o que esperava ouvir. Não sei o que queria ouvir. Sei o que ouvi. Sei que a primeira parte não foi novidade, ou acho que não foi. Sei que a segunda parte foi. Não estava à espera. A palavra futuro deu-me a volta ao cérebro e ao coração. Voltei. Como não voltar? Um ano depois... nada mudou, ou quase nada. A palavra futuro continua à espera de se materializar. Materializar-se-á se assim tiver que ser. Se não tiver de ser... vale a paz. E tudo vale a pena se a alma não é pequena, afinal.

Pág. 1/2

Mais sobre mim

foto do autor

Subscrever por e-mail

A subscrição é anónima e gera, no máximo, um e-mail por dia.

Arquivo

  1. 2024
  2. J
  3. F
  4. M
  5. A
  6. M
  7. J
  8. J
  9. A
  10. S
  11. O
  12. N
  13. D
  14. 2023
  15. J
  16. F
  17. M
  18. A
  19. M
  20. J
  21. J
  22. A
  23. S
  24. O
  25. N
  26. D
  27. 2022
  28. J
  29. F
  30. M
  31. A
  32. M
  33. J
  34. J
  35. A
  36. S
  37. O
  38. N
  39. D
  40. 2021
  41. J
  42. F
  43. M
  44. A
  45. M
  46. J
  47. J
  48. A
  49. S
  50. O
  51. N
  52. D
  53. 2020
  54. J
  55. F
  56. M
  57. A
  58. M
  59. J
  60. J
  61. A
  62. S
  63. O
  64. N
  65. D
  66. 2019
  67. J
  68. F
  69. M
  70. A
  71. M
  72. J
  73. J
  74. A
  75. S
  76. O
  77. N
  78. D
  79. 2018
  80. J
  81. F
  82. M
  83. A
  84. M
  85. J
  86. J
  87. A
  88. S
  89. O
  90. N
  91. D
  92. 2017
  93. J
  94. F
  95. M
  96. A
  97. M
  98. J
  99. J
  100. A
  101. S
  102. O
  103. N
  104. D
  105. 2016
  106. J
  107. F
  108. M
  109. A
  110. M
  111. J
  112. J
  113. A
  114. S
  115. O
  116. N
  117. D
  118. 2015
  119. J
  120. F
  121. M
  122. A
  123. M
  124. J
  125. J
  126. A
  127. S
  128. O
  129. N
  130. D
  131. 2014
  132. J
  133. F
  134. M
  135. A
  136. M
  137. J
  138. J
  139. A
  140. S
  141. O
  142. N
  143. D
  144. 2013
  145. J
  146. F
  147. M
  148. A
  149. M
  150. J
  151. J
  152. A
  153. S
  154. O
  155. N
  156. D