Para começo de conversa, devo dizer que já vivi sete meses da minha vida fora, mais propriamente no Canadá, há uns anos atrás. Isso muda logo a perspetiva. Se para quem nasceu e cresceu em Portugal, aquilo que temos de bom até pode ser um dado adquirido, quando vivemos fora alguns meses começamos a perceber que devemos mesmo valorizar o que temos de bom em Portugal. Eu própria não tinha bem noção deste privilégio que é nascer, crescer e viver em Portugal. Sucede que, fruto de coisas da vida e de decisões dos meus pais, há oito anos eu estava a entrar na universidade e eles decidiram que iam viver para o Canadá, sendo que eu fui com eles (um bocadinho por arrasto, confesso). Fui na condição de ir para lá estudar inglês e tentar entrar na universidade. Se eventualmente não gostasse, tinha a vaga na universidade garantida aqui. Não precisarei de dizer que voltei mais rápido do que fui, e que fiquei lá sete meses porque o curso de inglês a isso me obrigou. Estive lá de outubro a maio (descobri, portanto, as maravilhas do inverno canadiano em primeira mão e sem anestesia...e que bom que - não - foi!). Tudo o que eu posso dizer sobre isso é que a experiência serviu para confirmar a certeza de que não sou nada nómada, nem viajante, nem emigrante, nem aventureira. Nasci para ficar. E que bom que é nascer para ficar e viver no verbo ficar (que me perdoem mas o verbo ir não é par mim). Depois, podia dizer mil coisas sobre como achei o clima horrível, sobre como a cidade gigante em que estava me sufocava, sobre como as pessoas me pareciam estranhas, sobre como a cultura e a forma de ser eram tão diferentes de mim e do meu mundo, sobre a falta que senti dos sabores, das pesssoas e das paisagens portuguesas. Podia escrever mil coisas sobre como não é nada bonito viver com neve (é durante dois ou três dias, depois é só chato e a seguir é quase insuportável), sobre como os hábitos e horários e rotinas são tão estranhos, ou sobre como me senti o mais longe possível de mim e do que queria.
Isto para chegar ao ponto que queria: somos uns privilegiados em Portugal. Temos um clima espetacular. Temos paisagens únicas e lindas de viver. Temos praia por perto. Temos serra. Temos cidades lindas. Temos comida do melhor que há no mundo. Temos um país pacífico e seguro. Temos pessoas do mais genuíno e bonito que existe. Temos um país onde facilmente chegamos de uma ponta à outra. Escrevo isto porque, neste último mês e meio após o exame, tenho tido tempo livre (coisa que não tinha há muito tempo, para não dizer há muitos meses ou anos) e tenho aproveitado para passear. Sem ir para longe, sempre que posso aproveito e vou. Vou à praia cheirar o mar, vou à cidade ver as ruas bonitas, vou à serra ver a paisagem, subo a cidade para ter vistas bonitas. Não é a primeira vez nestes últimos tempos que fico espantada com a beleza do pôr-de-sol na praia, que fico espantada com a beleza das paisagens que encontro, que fico espantada com o clima que temos. Hoje fiz o mesmo: peguei e fui passear à praia. Um dia lindo, lindo. O tempo estava tão bom que continuei e fui pela costa abaixo. Ainda apanhei os raios do pôr-do-sol ao vir embora. Não precisei de muito: bastou pegar no carro e andar um bocado. Só isto. Ao nosso dispôr. Lindo. Único. Não sei se pareço um bocado deslumbrada (na verdade cresci habituada a ir à praia e nada disto é novo), mas talvez seja porque agora tenho um tempo e um espaço para apreciar as coisas que há muito tempo não tinha. A luz que temos aqui, o sol, as paisagens, a comida, a simpatia das pessoas e tudo o resto são algo único. Haverá mais países assim (lembro-me de Itália, por exemplo) mas nós temos uma sorte imensa por vivermos aqui. Temos mesmo e somos uns privilegiados. Quanto a mim, vou só continuar a agradecer por ter este país lindo ao dispôr e por ter a sorte imensa de ter nascido e crescido e de viver aqui. Vou continuar a aproveitar o que temos de melhor e vou tentar lembrar-me sempre disto, mesmo quando o tempo livre for menor. Vamos agardecer mais e aproveitar mais. Vamos lembrar-nos disto. Vamos olhar para a luz e para o sol que temos. Vamos apreciar a comida. Vamos aproveitar a hospitalidade e simpatia das pessoas. Vamos agradecer também por termos sistemas de saúde e de educação tendencialmente gratuitos (quanto a isto nem me vou alongar muito, mas não me perguntem quanto é que tive de pagar por um simples curso de ingês numa universidade canadiana porque foi uma fortuna... nem me perguntem quanto é que um tio meu pagou por ficar internado uma noite nos Estados Unidos porque também foi para lá de uma fortuna). Antes de resmungarmos de tudo e mais qualquer coisa, vamos pensar em tudo aquilo que Portugal nos dá de bom. A maior parte das coisas são tão simples e tão acessíveis a qualquer um de nós. Vamos agradecer e aproveitar. Eu sempre que puder vou continuar à procura do sol e das paisagens bonitas. Na praia, no topo da cidade ou no campo.
Esta fotografia é só em exemplo. Foi tirada em fevereiro de 2019 no norte. Quanta sorte temos nós por conseguirmos assistir a algo assim em pleno inverno?