Decidi...e que amar e o mar sejam já aqui!
Decidi e está decidido. Com este calor e estes últimos dias veio-me uma sensação ainda maior de ligação a casa.. à casa-terra, casa-mãe, casa-pai, casa-família, casa-infância, casa-ninho, casa-amor, casa-calor e casa-coração. E foi assim, razão lá ao fundo e coração por todo o lado e por todos os pensamentos que decidi. Custou decidir, custou mesmo, mas já está. Custou porque se perde sempre algo, e porque não é fácil saber que são caminhos de vida completamente diferentes. Que as pessoas que vou conhecer e os caminhos que vou traçar com a decisão que tomo e os meus dias poderiam ser completamente diferentes, melhores ou piores mas sempre diferentes. Fui lendo coisas e fui tentando ouvir as pessoas em quem confio, sempre sabendo que a decisão é só minha e é muito minha. Aquilo que fui lendo e ouvindo também não me encorajou muito a saltar. Não era aquilo que queria e abriu-me ainda mais os medos que já tinha. Pesei muita coisa, e a balança ia ficando sempre dividida. Sempre com a casa-ninho de um lado e a descoberta de outro. E depois, à medida que o tempo foi passando e os prazos se foram esgotando (ainda vou a tempo de mudar, ahahah), o peso foi caindo todo para o lado do coração e da casa-amor. Foi também começando a pesar quando li experiências de pessoas e percebi que aquilo que mais me poderia fazer experimentar outra cidade e universidade poderia estar mais perto do pesadelo do que do sonho. Foi pesando quando ouvi a minha amiga falar da experiência pouco positiva que teve. E pesou na hora em que vi o boletim de candidatura preenchido e o símbolo não era o dos meus últimos quatro anos. E na hora em que percebi que não o ia entregar ao sítio que tão bem conheço. E na hora em que tudo o que via no meu sítio e nestes quatro anos lá passados me parecia tão bonito e especial. Foi como um ataque de sentimentalismo ao melhor estilo de "daqui não saio, daqui ninguém me tira" ou "não me tirem a minha universidade, que a universidade é muito minha". Também pesou o facto de todas as minhas pessoas continuarem cá. Depois há muitas outras coisas. Assustou-me a distância, assustou-me o ambiente que poderia encontrar, assustou-me a hipótese de não gostar de nada e assustou-me ainda mais a ideia de me poder sentir sozinha. Assustou-me desmesuradamente a ideia de daqui a uns anos poder estar no centro do mundo e me sentir sem mundo porque as páginas de currículo preenchidas são inversamente proporcionais às páginas do coração (e da vida) em branco. Assustou-me aquilo que já li de alguém e que dizia "subi tanto que me ficaram as pessoas pelo caminho". Não consegui, tão pouco, configurar isso como uma possibilidade.. era e será sempre tudo o que não quero para mim. Foi com consciência disto e das expêriencias pouco positivas que me chegaram que decidi. E decidi em paz. Acima de tudo não me quis colocar numa posição vulnerável ou redutível. E tive, todos os minutos, a certeza de que nada paga o sentimento casa-ninho/casa-amor. Não há nem haverá nada mais bonito que a ideia de saber que ao fim do dia se pode abrir a porta de casa, essa casa-lar que é amor e é ninho. Acabei, no fundo, por seguir com a ideia que sempre tive. Não sei se fiz bem ou mal, se condicionei o futuro para o melhor ou para o menos bom, sei que houve um fundo de razão e muito coração e isso basta-me. Sei, e por isso é que escrevo este texto, que se um dia sentir que não fiz uma boa escolha vou ler este texto e ficar em paz. É isso que me importa. Isto ainda é menos fácil quando se tem um pai que nos manda voar e seguir, que nos quer fora do ninho para crescer e acha mesmo que o nosso caminho é conhecer e descobrir. Acontece que esse pai sabe muito de amor (que sabe) mas não sabe tudo. Não sabe que esta filha está, consciente e inconscientemente, condicionada pela má experiência (e má é eufemismo) que teve noutro país. Que esta filha sente todos os dias a falta dele e do círculo de luz e por isso troca tudo pela ideia de casa-amor e casa-ninho. Que esta filha vai cumprir um designío de vida (e curar muitas cicatrizes) no dia em que ele(s) regressar(em) à casa-ninho definitivamente. Que esta filha sonha com a ideia de o(s) ter na casa-terra todos os dias do ano. E sonha ainda mais com a ideia de viver sempre perto dele(s).. de poder almoçar com ele(s) e jantar sempre que quiser, de lhe(s) dar um neto ou mais e de o(s) ver fazer parte da sua educação. E esta filha espera, com o coração e com tudo o que tem, alma inteira e sonho de vida lá depositado, que nesse dia esse pai lhe agradeça por nunca ter desistido da casa-ninho. Nesse dia, esse pai que vai poder estar sempre perto e participar na vida da filha e na educação do(s) neto(s) há-de sorrir e agradecer por perceber que esse é o sentido da vida. E esta filha que hoje escreve vai sorrir e, em silêncio, saber para consigo que ensinou algo sobre o amor ao pai. E sorriremos juntos, e os nossos connosco, e as estrelas que temos nos céu piscarão o olho e dirão "a miúda até sabia umas coisas sobre o amor". Sim, estrelas nossas, eu sei que isto não foi só uma decisão minha.. foi minha mas teve um ar vosso e foi por mim, por eles e pela família-amor. Agora...agora é entrar no barco e percorrer o rio a toda a velocidade, sem parar. Com a certeza de que há algo em mim que me faz querer ser alguém "E a vida não vai parar / Vai como o vento / Tens tudo a dar / Não percas tempo / Podes saber / Que vais chegar / Onde deus te levar ". E venha o estudo e os testes e as sextas e os sábados e tudo o mais que tiver que vir. Venha isso e fique um "quincrível" no dia em que for mestre da culinária. Sim, isto é tudo sobre amor... e sobre querer muito mais subir as escadas da nossa casa de coração (e colo) cheio do que quaisquer outras. É que lá em cima há uma biblioteca linda que um dia não será só desse pai e desta filha, será também do(s) filho(s) que esta filha tiver que lá hão-de sentir a nossa paixão por livros. E aí, será no jardim com flores, música e livros que "re-lerei" isto e estarei eterna e infinitamente grata à vida, às estrelas, ao Bom Jesus e aos meus por tudo. Que o caminho se vá fazendo caminhando... e sabendo que amar e o mar são/serão já aqui.